- Poesia! Poesia! - gritámos, impacientes.
- Lê-nos poesia! - Nem consigo descrever a desolação que se apoderou de nós quando ela abriu um pequeno volume e começou a declamar a verbosa e sentimental tolice que continha. (…)
- Deve ter sido escrito por uma mulher - atalhou uma de nós.
Mas não. Ela disse-nos que fora escrito por um jovem, um dos mais célebres poetas do momento. Mal podem imaginar o estado de choque em que esta descoberta nos deixou. (…)
Ficámos todas em silêncio; e, nesse silêncio, ouvia-se a desgraçada da Poll a soluçar:
- Porquê que o meu pai me ensinou a ler?
Clorinda foi a primeira a cair em si.
- A culpa é toda nossa - disse. Todas nós sabemos ler. Mas nenhuma de nós, tirando a Poll, se deu ao trabalho de o fazer. Eu, por exemplo tomei como certo que era dever de uma mulher passar a juventude a dar à luz. Venerava a minha mãe por ter tido dez filhos; a minha avó, que pôs quinze neste mundo; a minha própria ambição, devo confessar, era ter uma vintena. Ao longo de todo este tempo, sempre acreditámos que os homens eram igualmente laboriosos e que as suas obras tinham igual mérito. Enquanto dávamos à luz os filhos, eles, julgávamos nós, davam à luz os livros e as pinturas. Nós povoámos o mundo. Eles civilizaram-no. Mas, agora que sabemos ler, o que nos impede de julgar os resultados? Antes de trazermos outra criança ao mundo, devemos prometer que iremos descobrir a verdadeira natureza deste.
Por isso, constituímo-nos numa sociedade destinada a fazer perguntas. (…)
- Desde Safo, não houve mais nenhuma mulher de primeira categoria … - começou a Eleanor, citando um semanário. (…)
- Assim, nunca mais chegaremos a nenhuma conclusão - queixou-se. - Como a civilização parece muito mais complexa do que imaginámos, não seria melhor limitarmos-nos à nossa questão original? Concordámos que o objetivo da vida era produzir boas pessoas e bons livros. (…)
- Assim que aprender a ler, só há uma coisa em que podes ensiná-la a acreditar, e é em si mesma. (…)
in: Uma Sociedade, de Virginia Woolf, Penguim Clássicos, Nº4, Lisboa, 2025