Aguarelas Finas, Le Corbusier | Maison La Roche, Paris

19 julho 2019

Quanto Mais Aprendo …

… muito particularmente Epicuro. Quanto mais aprendo sobre este extraordinário pensador ateniense, mais fortemente o reconheço como psicoterapeuta "proto-existencial"…
Muitas pessoas familiarizam-se com o seu nome através da palavra epicurista, que significa uma pessoa devotada aos prazeres, sobretudo aos gastronómicos. Mas, na realidade, Epicuro não era defensor de prazeres sensuais ou refinados, estando mais preocupado em alcançar a tranquilidade (ataraxia).
Epicuro exercia "filosofia médica" e insistia que da mesma maneira que um médico trata o corpo, o filósofo deve cuidar da alma. Na sua opinião, a filosofia tinha um único objectivo: aliviar a miséria humana. E quanto à raiz dessa tragédia? Epicuro acreditava que se devia ao nosso omnipresente medo da morte. A visão assustadora da inevitabilidade da morte, dizia, interfere com a satisfação que retiramos da vida, não deixando prazer algum intocado.

As ideias têm poder. O insight de muitos dos grandes pensadores e escritores, ao longo dos séculos, ajuda-nos a domar pensamentos destrutivos associados à morte e a descobrir caminhos importantes à medida que vamos atravessando a nossa existência. …
A ideia da morte inevitável, assustadora para qualquer um de nós, insistia Epicuro, interfere com a capacidade de gozar a vida e não deixa qualquer prazer incólume. Porque nenhuma actividade pode satisfazer a nossa ânsia de vida eterna, todas elas são intrinsecamente incapazes de nos satisfazerem completamente. Escreveu que muitas pessoas vão mesmo criando um ódio à vida até, ironicamente, ao ponto do suicídio; outras envolvem-se freneticamente em actividades sem objectivo, que não têm outro propósito a não ser evitar a dor inerente à condição humana.
Epicuro lidava com esta ânsia sem fim de preenchermos o nosso quotidiano com actividades novas, encorajando-nos a que, em lugar disso, optássemos por guardar e evocar as memórias profundas de experiências positivas. Sugere que, se formos capazes de aprender a recorrer a essa base de dados repetidamente, não teremos então qualquer necessidade de embarcarmos na busca incessante de situações hedonistas.
Diz a lenda que seguiu os seus próprios conselhos e, no leito de morte (de complicações subsequentes a cálculos renais), Epicuro conservou a equidade, apesar das dores terríveis, usando este mesmo exercício, ou seja, recordando as conversas agradáveis com o seu círculo de amigos e estudantes, que lhe haviam dado tanto prazer.
Faz parte do génio deste filósofo ter antecipado a visão contemporânea do inconsciente: enfatizava ele que, na maioria dos casos, as preocupações com a morte não são conscientes mas devem ser inferidas a partir de manifestações secundárias, por exemplo, uma religiosidade excessiva, a necessidade imparável de acumulação de riqueza, a procura cega de poder e privilégios, tudo coisas que oferecem uma versão falsificada de imortalidade.
Se somos mortais e a alma não sobrevive, insistia Epicuro, então nada temos a temer numa vida eterna. Não haverá consciência, nem tão-pouco remorsos pela vida perdida, nada a temer dos deuses.

Assumir que cada um de nós é finito e destinado a atravessar o desfiladeiro da infância até à maturidade, seguindo daí para o derradeiro declínio.

Uma das frases preferidas de Nietzsche é amor fati (ame o seu destino), ou, por outras palavras, crie um destino que seja capaz de amar.

O que somos. Somente o que somos é fundamental. Uma consciência em ordem, diz Schopenhauer, vale muito mais do que uma boa imagem. O nosso objectivo primeiro deveria ser a saúde e a riqueza intelectual, que nos conduz a um manancial sem fim de ideias criativas, a uma vida independente e moral. A equanimidade interior nasce do facto de sabermos que não são as coisas em si que nos perturbam, mas a interpretação que lhe damos.


in: De Olhos Fixos no Sol, Ultrapassar o Terror da Morte, de Irvin D. Yalom, Editor Luís Corte Real, Janeiro de 2016