Aguarelas Finas, Le Corbusier | Maison La Roche, Paris

16 março 2015

3 + 17 = 1 [Uma Linha]



A linha e o desenho das estruturas do pensamento.
As ligações neuronais e o significado adquirido pelas palavras.
Os conceitos e a sua significação.
As palavras que aqui se encontram escritas, estão organizadas em conjuntos de cerca de três, e são unidas por uma linha. Esta desenvolve-se e interliga-se com as seguintes, criando deste modo uma única linha, que apesar de única é interrompida por um espaço, espaço dedicado ao pensamento e à passagem para outro ano (esta ligação remete para o que corresponde a um ano lectivo, do ponto de vista académico).
Entenda-se por viagens um percurso efectuado entre Lisboa e Portalegre e Portalegre e Lisboa durante dezassete anos consecutivos e três enquanto estudante e também eles seguidos.
O sentido e a sua significação advém de um sentimento profundo no que diz respeito à consciencialização de um percurso e das várias oportunidades em cada viagem e em cada momento que o próprio percurso proporciona, pois viaja com ele e o corpo e a mente.
É um desenho a partir de uma linha. É uma linha a partir de um desenho.
É um desenho de um pensamento que não se vê, mas que se sente.
É um desenho da linha que desenha a palavra e esta adquire um significado num contexto de simbiose entre o riscar e a continuidade desse traço, risco, linha, cuja transformação ocorre e ganha importância maior na leitura e nas várias leituras ao longo do seu caminhar, do percorrer, do recordar e sobretudo do tomar consciência.
A mostra de uma "única" linha é a tentativa de unir o que foi também um "único" percurso, constituído de variados percursos e de diversos pensamentos, sintetizados numa ideia: partilhar e consciencializar de uma linha que afinal vai sendo a linha da Vida.
Um percurso, uma linha, um desenho, um olhar, um pensamento, um passeio…

in: 3 + 17 = 1 [Uma Linha], Exposição de Ana Gaspar, Instituto Politécnico de Portalegre, 11 de Março. 2015

02 março 2015

Franz Kafka | O Abutre e Outras Histórias

Resoluções

Sair de um estado de espírito miserável, mesmo que o tenhamos de fazer por pura força de vontade, deveria ser fácil. Eu forço-me a sair da cadeira, a caminhar até à mesa, a exercitar a minha cabeça e pescoço, a fazer os meus olhos brilharem, a apertar os músculos à volta deles. Desafio os meus próprios sentimentos, dou entusiasticamente as boas-vindas a A supondo que ele me vem ver, tolero amavelmente B na minha sala, engulo tudo o que é dito em casa de C, qualquer que seja a dor e a preocupação que tal me possa custar, em longas goladas.
No entanto, o que eu consiga, um único deslize, e um deslize não pode ser evitado, interromperá o processo todo, seja ele fácil ou doloroso, e terei de me reduzir novamente ao meu próprio círculo.
Portanto, talvez o melhor recurso seja ir passivamente ao encontro de tudo, fazer de mim mesmo uma massa inerte e, se sentir que estou a deixar-me levar, para que não me deixe convencer a dar um único passo desnecessário, olhar os outros fixamente com os olhos de um animal, não sentir remorso; em suma, reduzir ao mínimo qualquer réstia de vida que ainda me sobre, ou seja, ampliar a paz final do cemitério e não permitir que, para além dela, algo mais sobreviva.
Um movimento característico numa tal condição é passar o dedo mínimo ao longo das sobrancelhas.

in: Resoluções, de Franz Kafka, in: O Abutre e Outras Histórias, Estrofes e Versos, 2009, p. 89 e 90.