Aguarelas Finas, Le Corbusier | Maison La Roche, Paris

11 julho 2012

Jacques Rancière | A pintura no texto

Não há arte sem um olhar que a veja como arte. Contrariamente à sã doutrina que pretende que um conceito seja a generalização das propriedades comuns a um conjunto de práticas ou de objectos, é estritamente impossível exibir um conceito de arte que defina as propriedades comuns à pintura, à música, à dança, ao cinema ou à escultura.
O conceito de arte não é a exibição de uma propriedade comum a um conjunto de práticas, nem sequer uma dessas "semelhanças de família" que os discípulos de Wittgenstein convocam em último recurso.

A arte, tal como a designamos, só existe há uns meros dois séculos. Não nasceu graças à descoberta do princípio comum às diferentes artes - senão seriam precisos esforços superiores aos de Clement Greenberg para fazer coincidir a sua emergência com a conquista para cada arte do seu "medium" próprio. A arte nasceu num longo processo de ruptura com o sistema das belas-artes, isto é, com um outro regime de disjunção no seio das artes.

A arte em geral existe em virtude de um regime de identificação - de disjunção - que dá visibilidade e significação a práticas de arranjo das palavras, de arranjo expositivo das cores, de modelagem dos volumes ou de evolução dos corpos, que decidem, por exemplo, o que é a pintura, o que se faz ao pintar e o que se vê num mural ou numa tela pintados.

in: O Destino das Imagens, de Jacques Rancière, Orfeu Negro, pp. 99 a 101