Aguarelas Finas, Le Corbusier | Maison La Roche, Paris

17 setembro 2014

Simples Diários Complexos | Edgar Morin

Opor questões científicas com humanistas, para Morin, é perder dos dois lados. Vivemos em um mundo onde nunca se disseminou tanto conhecimento e, por isso, articular as diferentes áreas nunca foi tão necessário, segundo o filósofo. Justamente pelo facto de o mundo ter ficado mais complexo, Morin busca novas estruturas mentais de compreensão desse novo universo, formas alternativas de integração.
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Quando se escreve um livro vira uma testemunha.
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Há muitas razões: para os críticos, os escritores, os filósofos, os sociólogos, eu sou uma espécie de camaleão, não sou um escritor, não sou um filósofo, um sociólogo, não tenho forma, não tenho etiqueta, logo não inspiro interesse. Então, uma maneira de fazer as minhas ideias serem conhecidas é fazê-las passar também pelas entrevistas. Me sinto um pouco obrigado a dar entrevistas.
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Bom, para começar a curiosidade é própria das crianças, mas se os professores não têm paixão, se estão entediados, acabam arrefecendo a curiosidade delas. Creio que há dois problemas: uma coisa que diria Platão é que para ensinar é necessário amor, paixão. Essas condições não estão num manual, porém são fundamentais; o segundo problema é que precisamos relacionar as disciplinas múltiplas. Se você fizer a seguinte pergunta: "o que é ser humano?" Essa é uma pergunta sobre os diversos saberes que temos em relação ao ser humano. Eu vejo que as ciências humanas estão dispersas, a Psicologia, a Sociologia. Também temos os conhecimentos que nos dá a Literatura, porque ela nos ensina sobre o ser humano. Podemos pensar também na Biologia… Se você ensina o que é o ser humano aos seus alunos, você os cativa. Eu acho que uma ciência muito interessante é a História.
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Bom, a complexidade foi formulada pela primeira vez entre matemáticos, engenheiros e cibernéticos. … Eu creio que nós estamos numa época em que a complexidade se impõe sobre a compartimentação. É um novo caminho para o mundo, para o ensino. Isso já acontece em alguns países da América Latina, o Brasil, por exemplo. Sobretudo é necessária uma mudança de estrutura mental.
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É muito difícil definir a inteligência porque não é um quociente individual. A inteligência é um conjunto de qualidades muito diferentes porque necessita de capacidades de síntese, de análise e, no mínimo, de capacidade reflexiva e autocrítica. A inteligência necessita também de sensibilidade, porque a razão fria é muito limitada, mas uma paixão sem razão é muito limitada também. É necessária a mistura de razão e paixão. Então penso que a inteligência não tem uma definição simples. Há uma complexidade de elementos que permitem a inteligência. Há outra coisa que ultrapassa a inteligência, que é a capacidade de criar. A criatividade é algo em que é preciso capacidade intelectual, mental, cerebral. A possibilidade de fazer uma combinação nova, de fazer descobertas novas também exige inteligência. … Então, a inteligência é a capacidade de admiração, de se inquietar, a curiosidade… muitas coisas se somam à inteligência, é um coktail, e quando bem feito é como uma boa caipirinha.

in: Simples Diários Complexos, Edgar Morin por Sérgio Mélega, Revista Filosofia, Nº 78, 2013, pp. 5 a 13.